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O exílio. Marca maior desta data do nono dia do mês Av (Tisha Báv). Coincidência proposital do sentido pela qual a data de destruição do primeiro grande templo ocorre no mesmo dia , quase setecentos anos antes , que a destruição do segundo templo. O mesmo dia em que Bar Kochba derrotado institucionaliza o eterno exílio judaico. Não o exílio da autodeterminação , mas o exílio de que nos falam estas coincidências. Pois nessa data os judeus foram expulsos da Inglaterra e também da Espanha , o maior trauma medieval judaico. Data que inicia pogroms , data em que se inicia a primeira guerra mundial e um destino macabro ao judaísmo do século XX. Data do lançamento da primeira bomba atômica sobre seres humanos. Data de muitas outras coisas , coisas que talvez só você saiba , destes agostos das bruxas em que cai este dia. O nono mês de Av. Data desconectada do calendário solar e lunar , um dia qualquer. Seu símbolo não é a tristeza ou o medo da noite , mas o desespero do meio-dia do sol que racha o solo , o sol que se parece , infinitamente se parece com todos os outros sóis de todos os outros infindáveis dias. Momento de saudades , de aperto , de angústia , não do escuro , facilmente desmentido pela luz , ma das própria luz que não parece conduzir a lugar algum , este lugar onde não queremos ir - todos. É a falta. A falta assimilada. Tisha B'Av não é uma festa sobre a tristeza , mas uma festa da angústia e do desespero. Para os do hemisfério norte , um enigma em pleno verão , onde fica claro - festa da história e não da natureza. Delicioso desespero que a tradição judaica transformou em ironia , a mesma que nos esclarece que "se não fossem pelas lágrimas não perceberíamos o desagregar-se das cores no arco-íris". Depressão que não é down , que é saudade das sombras que o sol a pique nos sabe roubar. Luz que a vela na privacidade da alma segredos que já nascem saudades. Dia de jejum , de sentir o gosto de si mesmo - saliva repleta de gostos nunca mais sentidos , de uma infância questionável , de um futuro incerto. Tal qual a água sob certas condições é gelo ou ar , assim é a alma - sob certas condições de luminosidade , é exílio. Os judeus aprenderam a pintar seus séculos com este tom da alma humana , sua história ajudou. E , tal qual os cálculos indicavam , o fim do poço é o fim , não passa daí. Pois neste dia de acontecimentos fatídicos , de expulsão , de saudades do exílio , neste mesmo dia nascerá o messias - não- exilado. Conta a tradição:
'E o Líbano cairá nas mãos dos poderosos e então florescerá a semente de Jessé.' 'Líbano' , refere-se ao templo construído de cedros-do-líbano e a 'semente de Jessé' refere-se à casa de David , pois Jessé era seu pai e dele descendera o Messias. Portanto , poderia ter descoberto sobre tudo isso lendo Isaías". Este judeu precisou aprender sobre o que acontecia por intermédio de três meios: pelo árabe, pela experiência própria, e através da bíblia. O Messias não virá enquanto não aprendermos destas três maneiras - pelo exílio ou pelos outros, por nossa vivência própria e, por último, pela tradição. Este mundo confuso e não redimido - o exílio; esta saudade insaciável, parceira eterna - o exílio; e este Tisha B'Av , coincidência proposital do sentido. Perguntar-se-á alguém menos familiarizado: "Precisa ser tão cinzenta esta tradição?" Ela não é - Promove arco-íris. A diferença, como diz Wiesel, é que não ultrapassamos a espera, nós nos ultrapassamos no interior da espera. Nilton Bonder |