A HEALING - CURA

Janet F. Quinn


 

 

A raiz da palavra healing (cura) vem da palavra anglo-saxã haelen, que significa estar ou tornar-se inteiro, íntegro. Éclaro que a integridade, quando relativa aos seres humanos, ‚ por demais abrangente para se limitar ao mundo físico. Assim, a ausência de alguma parte física ou a perda da função de alguma parte não nega a integridade, da mesma forma que a presença e funcionamento adequado dessas mesmas partes não garantem a integridade.

A sabedoria popular nos diz que healing e sa£de dizem respeito a uma "harmonia de corpo-mente-espírito". Se conseguirmos superar o jargão e começarmos a compreender o significado mais profundo dessas palavras, poderemos nos aproximar do entendimento de integridade, ao menos intuitivamente.

A palavra harmonia pode ser encontrada em enciclopédias como sinônimo de conexão. Outros sinônimos para conexão são relação, congruência e unificação; os sinônimos para harmonia incluem unidade, ordem, paz e reconciliação. Se nos dispomos a meditar sobre estas palavras, permitindo que nos atravessem e se instalem em nossa consciência, elas começam a se entrelaçar num bordado rico e significativo. A imagem que emerge sugere que quando falamos de integridade, estamos falando basicamente sobre relacionamento.

Este se relacionar ‚ o oposto de alienação, isolamento, estranheza e fragmentação. Qualquer uma dessas coisas ou todas elas podem ocorrer em diferentes níveis da existência humana, com ou sem consciência de nossa parte. Podemos estar alienados do nosso corpo, do nosso eu mais profundo, dos nossos amigos mais próximos ou da sociedade. Não importa em qual nível, quando estamos alienados ou isolados, não estamos inteiros: estamos doentes. Quando o healing verdadeiro ocorre, a relação ‚ restabelecida.

Dada esta conceitualização de healing, o que facilita o processo? Quais são os princípios universais de healing?

O mais importante ‚ que podemos observar que o locus (localização) do healing se encontra dentro do paciente. O healing, não importa qual o tipo de intervenção, não ‚ algo que possa ser dada por (ou que pertence a) um m‚dico ou terapeuta. Todo healing, sem exceção, ‚ uma auto-cura.

Nós trabalhamos sob o mito de que são os profissionais de sa£de que curam as pessoas. Isto ‚ simplesmente uma ilusão, produto de uma lógica errada. Assumimos que, se um paciente melhora após a cirurgia, está melhorando por causa da cirurgia. A realidade ‚ que a cirurgia não cura/heal. Os remédios não curam/heal. A acupuntura, cristais, homeopatia não curam/heal. A pessoa que se submete a uma cirurgia, ou toma remédios, ou recebe o tratamento alternativo tem que se curar a si mesma. Qualquer um ou todos os m‚todos acima descritos podem atuar no sentido de remover barreiras ou estimular a auto-cura, mas não constituem causas suficientes para a cura. Sabemos que isto ‚ verdade pelo anedotário clínico, no qual alguns pacientes morrem apesar da cirurgia ter sido "bem-sucedida".

Healing ‚ uma resposta total, orgânica, sinérgica que precisa emergir do indivíduo para que a recuperação e o crescimento possam se realizar. Eu cunhei a expressão o Efeito Haelen para me referir … totalidade da resposta … cura. O Efeito Haelen se caracteriza, entre outras coisas, pelo princípio de equifinalidade do sistema: muitos caminhos podem levar ao mesmo ponto no final. O Efeito Haelen pode ser estimulado por uma série de intervenções externas ou por nenhuma delas. A elicitação do efeito, a resposta total do organismo em direção … integridade, ‚ o objetivo de qualquer intervenção de cura.

Uma intervenção planejada para atingir a este objetivo começa com os procedimentos menos intrusivos e somente então, se necessário, parte para outros, sem esquecer que a localização do healing est no Efeito Haelen e que qualquer procedimento pode ser mais ou menos eficaz para cada pessoa. Cirurgia e drogas não são as técnicas formas "reais" de tratamento e as intervenções alternativas não podem ser descartadas como triviais, ou sendo capazes de produzir meramente um efeito "placebo".

Além do modificar o modo como pensamos sobre intervenções, este conceito do locus do healing ocasiona uma mudança fundamental no pensamento sobre o papel do terapeuta. Dentro deste conceito de cura, o terapeuta funciona na capacidade do que pode ser melhor descrito pela figura da parteira. (Eu pediria aos leitores que ignorassem aqui o gênero associado ao termo e simplesmente considerassem o papel, que ‚ preenchido tanto por homens quanto por mulheres). A parteira ‚ aquela que auxilia o processo de nascimento, trazendo … tona uma nova vida, uma nova relação. Isto ‚ o que está envolvido inerentemente na interação de cura.

Quando a cura real acontece, sempre h nova vida surgindo. Healing ‚ criativo, trazendo padrões e conexões que não existiam antes. Mais que simplesmente retornar a algum nível anterior do ser, healing envolve o surgimento, a emergência, e durante a emergência ‚ preciso uma parteira e não um cirurgião. Ao invés de se impor ao sistema, a parteira permite que o sistema se mova do seu próprio jeito; ela não força, mas facilita; não empurra, mas recebe; não insiste, mas aceita. A parteira está preparada para tomar medidas mais enérgicas, mas somente quando elas se tornam essenciais.

A parteira encara a emergência com a confiança fundamental na sabedoria do processo e do corpo. Ela representa um lugar seguro dentro do qual uma nova vida pode emergir. Ela ampara a nova vida com deslumbramento e reverência e não pede para si nenhum crédito pela miraculosa chegada, satisfeita de ter estado presente durante a viagem.

Compare as imagens que lhe ocorreram lendo o que está escrito acima com as imagens criadas pelo seguinte: "Vamos lutar contra isso; vamos ganhar a guerra contra o câncer, esta ‚ a droga mais poderosa que você pode conseguir". Isso deixa claro que estamos lidando com dois estados mentais muito diferentes que requerem dois papéis diferentes para os terapeutas. Um tem como objetivo curar doenças e o outro se refere ao nascimento da sa£de/integridade.

Não se está sugerindo aqui que o tratamento convencional da doença seja descartado. Ao contrário, estou sugerindo que precisamos estar conscientes destas distinções e, quando procurarmos a cura, respondamos com enfoques que são apropriados para proporcionar o Efeito Haelen.

Hoje em dia nossas doenças são cada vez mais espirituais e no entanto, nossos tratamentos são cada vez mais biofísicos. As instituições de tratamento de doenças agora fazem propaganda no sentido de nos convencer de que podem prover "os melhores cuidados através das maiores e mais novas m quinas para atacar as doenças". Os cuidados agora se tornaram sinônimo da provisão de coisas e procedimentos, apesar do fato de que 80 porcento dos problemas que as pessoas apresentam para tratamento médico são auto-limitados e milhares de pessoas visitam os consultórios médicos por ano somente para serem tocadas.

As enfermeiras, que tradicionalmente têm provido o cuidado de pessoa para pessoa, estão saindo o sistema de sa£de aos bandos. Por quê? Porque elas entraram no sistema para serem healers, parteiras do processo de cura, mas se encontram cada vez mais tomando conta de m quinas.

Acredito que estas circunstâncias são a conseqüência de uma cultura na qual o princípio feminino foi ignorado e desvalorizado. Estamos tristemente em desequilíbrio e fora da relação certa. O princípio feminino se preocupa profundamente com a relação que alimenta. O trabalho das enfermeiras tem sido tradicionalmente trabalho de mulher e não ‚ muito valorizado pela sociedade. Entretanto, o trabalho de healing sempre representa o feminino em ação, seja qual for o sexo de quem cura.

Torna-se cada vez mais claro que, se continuarmos no nosso curso de crescente isolamento e alienação, nós nos auto-destruiremos. O sistema forja esta atitude ao manter autoridade absoluta sobre questões de sa£de e doença. No entanto, este sistema não consegue mais sustentar tal postura econômica, social ou eticamente. Ele precisa começar a afrouxar seu domínio.

Healing no futuro precisa incluir grandes mudanças no modo como pensamos sobre sa£de e doença. O foco do sistema de sa£de deve ser o de facilitar a integridade, o que significa facilitar a relação certa. As técnicas não vêm ao caso. O que precisa acontecer tem dois aspectos: a revalorização do princípio feminino e seus caminhos e o empowerment (dar poder) de indivíduos e comunidades para a criação de sua própria sa£de e cura.

O papel mais importante que profissionais de sa£de poderão cumprir no futuro ser educacional. No mínimo, deve-se dar …s comunidades a oportunidade de aprenderem a se tornar healers de si mesmas. Por exemplo, nós precisamos de centros comunit rios de cura, dirigidos por voluntá rios na terceira idade, que tivessem sido treinados em massagem terapêutica ou no uso de imagens de cura. Poderíamos diminuir os custos de cuidados com a sa£de dramaticamente, se ensinássemos as pessoas a curarem umas …s outras.

Este ‚ somente um dos aspectos dos efeitos de tal plano. Precisamos simplesmente imaginar o tipo de conexão comunitária que poderia se desenvolver em tais circunstâncias e considerar as conseqüências para o healing planetário. Quando a pessoa entra no processo de se tornar um healer, muda para sempre. Conforme o feminino encontra espaço para se desenvolver, a pessoa começa a apreciar o milagre e a sacralidade da vida e a unidade fundamental entre as pessoas. Esta consciência do todo, esta relação certa com nós mesmos e com o nosso meio-ambiente, ‚ a técnica esperança que temos para a sobrevivência do planeta. O relacionamento não ‚ algo somente prazeroso ou algo a se conseguir depois que ganhamos bastante dinheiro ou prestígio. Ou seremos curados, emergindo numa relação certa conosco e com nosso planeta ou morreremos.

Quando consideramos caminhos para o healing no futuro, não podemos mais perguntar, "O que os healers podem fazer pela humanidade?", mas sim precisamos perguntar "Como podemos transformar toda a humanidade em healers?" Eu sugeriria que só h uma resposta. Precisamos nos concentrar em nosso compromisso de empowerment (dar poder) e, ao fazer isto, precisamos reconhecer, reverenciar e permitir o ressurgimento e a revalorização do feminino. Não temos escolha e o tempo ‚ curto.

SOBRE A AUTORA:

Janet F. Quinn, PhD, RN, ‚ professora associada de enfermagem na Universidade da Carolina do Sul. Ela tem estado envolvida na pr tica, ensino e pesquisa sobre toque terapêutico desde 1976. Ela ‚ autora de v rios artigos e capítulos de livros sobre toque terapêutico e conduz oficinas nos Estados Unidos e Canadá .

Tradução: Celia Szterenfeld..

 

 
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